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A simpatia de Samuel Rocha fora do palco é a mesma que ele demonstra quando empunha seu violão de sete cordas bem acima da cintura, tocando de pé o tempo todo, assim como a maioria dos músicos que arregimentou para seu show “Bordando o Sete”, com o qual abriu na noite deste sábado, (30), no anfiteatro do Dragão do Mar com excelente público, a etapa Fortaleza do Festival Choro Jazz.
Celebrando 15 anos, o evento teve início na sexta-feira, com oficinas na Casa de Vovó Dedé, ONG na Barra do Ceará, “periferia” (em relação a qual “centro”?) de Fortaleza, com Paulo Sérgio Santos, Pedro Amorim, Mauricio Carrilho, Yacoce Simões e Marco Lobo. A programação de shows teve início – e que início! – neste sábado e segue até domingo, quando se apresentam, a partir de 19h, Mimi Rocha, O Trio (Paulo, Pedro e Mauricio) e Roberto Menescal, Leila Pinheiro e grupo.
Tudo com entrada franca, como é tradição no festival, apresentado pelo Ministério da Cultura e patrocinado pela Petrobras, facilitando o acesso à música instrumental e cantada, em recortes desde a tradição até a novidade. E foi exatamente um repertório novo, 100% autoral, que o público aplaudiu no primeiro show da etapa Fortaleza, tudo com muita fluidez e musicalidade, nos arranjos “de domingo” elaborados e ensaiados com esmero por Samuel e seus músicos: Claylton Gomes na flauta, Paulo Maurício no clarinete, Ray Douglas no trompete, Lauro Viana no cavaco e Igor Ribeiro na percussão.
Não por acaso, muitos deles herdeiros diretos do saudoso mestre Tarcísio Sardinha, que partiu tão precocemente, mas deixou, além de uma obra impressionante e ainda por ser registrada e divulgada devidamente, seu principal legado: a formação de várias gerações de músicos e músicas do Ceará para o Brasil.
E a turma estava inspirada, como o mestre estaria, certamente, diante de um festival que destaca os chorões desta “fornada” que, agora, une juventude e experiência. Afinal, Samuel, que desde os anos 90 milita na cena do choro, comprovou no show por que é, faz tempo, um artista maduro e certo de seu caminho, transcendendo o (necessário) universo dos clássicos do choro para se lançar em shows pela Europa e levar ao público outras possibilidades, com um trabalho autoral que se destaca mesmo para quem o conhece tendo o show por primeira audição.
Em nenhum momento a plateia deixou de seguir com fluidez e naturalidade o show, iniciado com “Ao mestre Dominguinhos”, um “baião com arranjo valendo”, já deixando claro o carisma de Samuel e a destreza de Paulo Maurício, emocionado por receber elogios e tocar no mesmo festival que seu mestre, Paulo Sérgio Santos, do O Trio. Paulo saiu do hotel pro Dragão do Mar, para assistir ao jovem colega de instrumento. Um entrecruzar de tempos e espaços, entre dois artistas dedicados ao som da madeira.
E se o baião abriu a noite com a energia lá em cima e demonstrando o esmero nos arranjos que viriam por ali, “Influência”, de Samuel, Sardinha e Pedro Madeira, ressaltou uma vez mais a importância do falecido violonista cearense para essa e outras gerações. Uma música enternecedora, de tão bela, e que convidou ao público um momento mais cadenciado, ainda cedo no show.
“Assovio do Tiê” retomou o ritmo e a alegria, com a energia trazendo a plateia de volta a uma dinâmica de ativação, dando boa noite ao sábado. Assim como o xote “Vida boa”, de Samuel e Luis Moraes, violonista cearense radicado na Inglaterra, com o clarinete novamente brilhando e com seu Domingos mais uma vez revisitado.
“Aquiles na gafieira” veio como homenagem a um jovem trompetista carioca, amigo de Samuel, e “Cheiro de mãe”, uma linda balada com a flauta em sopro percussivo ao final, deixou o público mais uma vez em silêncio de admiração. A avó de Samuel também foi celebrada, com a salsa-samba “Patarábia”, em outro exemplo do cuidado do artista – e de seu time de craques – com os arranjos.
“Posso dizer que sou cria desse festival. Frequento como aluno desde a segunda edição. Estar aqui neste palco, mostrando meu trabalho autoral, entre amigos queridos, é motivo de muita felicidade”, destacou Samuel Rocha, antes de partir para a reta final da apresentação, que abriu com toda a riqueza e a musicalidade a etapa Fortaleza do Festival Choro Jazz. Que esta brilhante geração de músicos do Ceará continuem bordando o sete pelo Brasil e pelo Mundo.